IVFRJ On Line - 45ª Edição
Ano III - 09 de maio de 2007
Um novo fármaco para tratar a hipertermia maligna
 
Por Edna Ferreira

Como ajudar a combater uma doença que na maioria das vezes não manifesta sintomas e pode aparecer de repente? Assim é a hipertermia maligna (HM), uma doença de natureza farmacogenética que acomete o músculo esquelético. A busca de um novo medicamento para o tratamento da hipertemia é o trabalho ao qual se dedica o professor Roberto Takashi Sudo e sua equipe do Laboratório de Farmacologia do Acoplamento e Excitação-contração Muscular, no Departamento de Farmacologia Básica e Clínica do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ.

Prof. Roberto Takashi
Laboratório de Farmacologia do Acoplamento e Excitação-contração Muscular - DFBC - ICB/UFRJ.

Roberto Takashi possui graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1976), especialização em Farmacologia (1976), Fellow da Divisão de Pesquisa Cardiovascular da Cleveland Clinic Foundation (1983), mestrado em Ciências Biológicas (Farmacologia e Terap. Experimental) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1981) e doutorado em Ciências Biológicas (Biofísica) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1988).

Com Pós-Doutorado na Divisão de Farmacologia Clínica da Thomas Jefferson University, USA (1989-1990), ele também concluiu o Pós-Doutorado no Laboratório de Hipertermia Maligna da Wake Forest University nos períodos de dezembro de 1995 a dezembro de 1996 e janeiro a dezembro de 2000.

Em entrevista ao IVFRJ On Line, o professor Takashi fala de sua pesquisa e como um novo fármaco pode ajudar as pessoas portadoras de HM.

Do que trata o seu trabalho?

Um dos trabalhos do Laboratório de Farmacologia do Acoplamento e Excitação-contração Muscular localizado no Departamento de Farmacologia Básica e Clínica do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ sob minha responsabilidade visa desenvolver um novo fármaco/medicamento para o tratamento da hipertermia maligna (HM). A HM é uma doença de natureza farmacogenética que acomete o músculo esquelético. Pacientes portadores desta doença são assintomáticos na maioria das vezes. A crise de HM é desencadeada de maneira súbita durante a anestesia geral, no momento em que os indivíduos suscetíveis entram em contato com agentes anestésicos gerais inalatórios usados em mais de 60% das anestesias. A crise de HM é dramática levando ao óbito em mais de 70% dos casos. A descrição da HM é relativamente nova e ainda de pouca divulgação entre os médicos.


Como age essa doença?

O mecanismo da hipertermia maligna está vinculado a mutação no receptor da rianodina tipo 1 (RyR1) presente na membrana do retículo sarcoplasmático de músculo esquelético. O RyR1 é a principal proteína responsável pela liberação de cálcio necessário para a contração muscular. A mutação provoca alteração funcional do RyR1 tornando-o muito mais permeável ao cálcio na presença de determinadas substâncias como os anestésicos gerais inalatórios (halotano, enflurano, sevoflurano, desflurano) e o relaxante muscular, succinilcolina, também usada na anestesia. O aumento incontrolável do cálcio na célula ativa o estado de hipermetabolismo (hipertermia, aumento do consumo de oxigênio, rigidez muscular, etc), lise da membrana celular e extravasamento de elementos intracelulares para o sangue. A morte é inevitável na maioria dos casos não diagnosticados precocemente ou quando o tratamento adequado não é rapidamente iniciado. Há no momento apenas uma substância clinicamente disponível para o tratamento da HM. Esta substância denominada de dantrolene sódico reduz a mortalidade para 10% dos casos, porém, é de alto custo (cerca de 3.500 Reais o kit) e de difícil uso clínico em função da baixa solubilidade. O projeto desenvolvido na UFRJ, em colaboração com a indústria química e farmacêutica (Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos Ltda) tem como objetivo sintetizar em quantidade industrial, investigar a eficácia farmacológica e avaliar a toxicologia pré-clínica de um novo fármaco para o tratamento da HM, com solubilidade 30 vezes superior ao protótipo dantrolene sódico, denominado de azumolene.


Desde quando este trabalho se desenvolve e em que etapa ele se encontra?

Em colaboração com a indústria, este trabalho começou em dezembro de 2004. O azumolene sintetizado pelo Laboratório Cristália foi encaminhado em fevereiro de 2005 e os primeiros testes realizados em março de 2005. A potência do azumolene foi comparada ao dantrolene em preparações in vitro de músculo esqueléticos de roedores e em preparações in vivo em roedores não portadores de HM. Nestes testes ficaram constatados que a potência do azumolene é igual ao do dantrolene. A eficácia do azumolene em reverter a crise de HM foi comprovada em porcos portadores de HM em estudo realizado em colaboração com o Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa e em músculos esqueléticos de pacientes portadores de HM. O projeto encontra-se em fase terminal tendo-se concluído o estudo de toxicidade aguda e 80% da toxicidade subaguda concluída. Temos a expectativa de encerrar o estudo pré-clínico até julho de 2007 para que o estudo Clínico Fase I seja iniciado.


Quais os principais resultados esperados?

Primeiro, que a indústria química e farmacêutica desenvolva metodologia de síntese do azumolene em quantidade industrial; segundo, que o azumolene seja eficaz em reverter o quadro agudo animais que expressam a crise de HM; terceiro, que o azumolene seja uma substância segura tanto para administração aguda quanto para a administração prolongada e de fácil manuseio clínico.


Que impactos tais resultados terão para a sociedade?

a) O Brasil será o primeiro país a disponibilizar clinicamente o azumolene, substância esta esperada em vários países, principalmente os da Europa;

b) o tratamento da crise de HM poderá ser realizado de maneira mais rápido e seguro em função da solubilidade aumentada do azumolene em comparação ao dantrolene;

c) possibilitar que todos os hospitais que usam anestésicos gerais inalatórios tenham condições de adquirir o medicamento que reduz a mortalidade da HM.


A pesquisa é apoiada por algum financiamento? De quanto e de onde?

Sim. O projeto é apoiado pelo Ministério da Ciência Tecnologia/FINEP/Ação Transversal (Proc. Ref. 01.04.0913.00) em parceria com o Laboratório Cristália Produtos e Farmacêuticos Ltda especificamente para desenvolver o azumolene. O recurso de R$ 512.000,00 sendo 50% para cada parte (MCT/FINEP e Cristália) é gerenciado pela FUJB/UFRJ.


Além do seu laboratório, existem outras instituições envolvidas no trabalho? Poderia citar alguns pesquisadores colaboradores?

O projeto envolve o nosso Laboratório localizado no Departamento de Farmacologia Básica e Clínica do ICB e os pesquisadores do Laboratório Cristália. Há envolvimento de Laboratório privado, não contemplado pelo recurso, para a complementação de alguns testes de toxicologia.


FAPERJ

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