Escola
de Química da UFRJ desenvolve fitoterápico contra
a hipertensão
Um fitoterápico, que reduz a pressão arterial, sem
provocar efeitos colaterais e de baixo custo. O que
parece sonho para muitos hipertensos está prestes a
se tornar realidade. Uma pesquisa realizada com o exsudato de cajueiro desenvolvida pelo Laboratório
de Processos Orgânicos, da Escola de Química da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
revelou que o derivado natural extraído da casca do
cajueiro, depois de processado, pode ajudar a
combater a pressão alta.
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“O Brasil é o terceiro maior produtor de caju do
mundo, a tecnologia para produzir o fitoterápico é
nacional, temos tudo favorável. A agroindústria do
caju só se interessa pelo pseudofruto e pela
castanha, não utiliza o exsudato para nada, fica
jogado no chão das fazendas. Conseguimos resultados
positivos como fitoterápico com algo que é
normalmente rejeitado pela indústria”, ressalta a
professora Cheila Gonçalves Mothé,
engenheira química responsável pela pesquisa da goma
terapêutica contra hipertensão.
O número de hipertensos no Brasil é bastante
significativo, são 12 milhões de pessoas, e apenas
15% delas estão em tratamento, ou seja, 8 milhões
de pessoas sofrem com a doença, não dispondo de
recursos para a compra de medicamentos. “A goma do
cajueiro seria uma alternativa de custo barato, a
ser distribuído pelo SUS”, explica Mothé que
acrescenta ainda que a descoberta pode ser benéfica
também para ampliar a geração de trabalho e
renda: “além do emprego na indústria do
fitoterápico, surgiriam os catadores do exsudato e
também as plantações voltadas pra extração
desta substância”.
Exsudato
de Cajueiro
O exsudato é uma substância liberada no caule do
cajueiro quando este sofre agressão do meio
externo. É uma resina, inodora, de coloração
amarelo- âmbar, que passa por processo de
purificação até dar origem a um pó branco rico
em polissacarídeos. A
goma é triturada, solubilizada, centrifugada,
filtrada, precipitada em etanol e finalmente
atravessa uma fase de secagem
em estufa. Ao
todo são seis etapas de purificação que foram
desenvolvidas e patenteadas pelo laboratório de
Processos Orgânicos da UFRJ, onde nenhum processo
é agressivo quimicamente. O rendimento da
substância é de 70%, o que resulta em um produto
100% natural.
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“O pó do exsudato pode ser ingerido junto aos
alimentos e também preparado em forma de cápsulas
ou comprimidos”, explica a professora Cheila Gonçalves
que fala que para a sociedade poder usufruir desta
nova descoberta
“falta apenas a vontade política ou da
iniciativa privada”. Mothé revela que já recebeu
assédio de multinacionais para o desenvolvimento do
produto, mas que se recusou a vender a patente pois
acredita que este fitoterápico deve ser destinado
aos brasileiros de baixa renda. “Acho que é o
Brasil que deve comercializar esta descoberta, penso
isto como uma questão social’’.
Funcionamento
no organismo
O efeito produzido pelos polissacarídeos e
proteínas presentes na goma, aumenta o número de
macrófagos (células de defesa do sistema
imunológico), tornando o organismo mais saudável,
estimulando o corpo a eliminar gorduras ou outras
substâncias nocivas do mesmo modo que o exercício
físico. Os resultados com as cobaias foram muito
promissores. No grupo de ratos hipertensos que
ingeriu a goma, as células do coração ficaram
homogêneas e já no outro grupo, que não recebeu
medicação, as células apresentaram hipertrofia. A
partir de julho a goma será testada em voluntários
com pressão alta.
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Fotomicrografias
à
Cortes longitudinais do miocárdio do VE de
SHR.
Coloração: Masson |
“Nós adicionamos esta goma em sucos tropicais,
derivados de carne (salsicha) e emulsão para salada
(maionese), testamos em humanos e verificamos que não
há efeitos colaterais. Esta é uma grande vantagem
desta goma, visto que os fármacos sintéticos podem
ocasionar diversas reações adversas aos
pacientes”, lembra a pesquisadora da UFRJ.
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Pressão
arterial sistólica, em mmHg., dos ratos dos
grupos Controle e dos grupos Goma durante as
semanas de experimento. |
Alimento
funcional
A goma pode se tornar alimento funcional com
características terapêuticas para evitar doenças
cardiovasculares. “Para evitar o boicote da
indústria farmacêutica de sintéticos,
desenvolvemos um produto natural, queremos que ele
entre no mercado como alimento funcional para não
entrar em conflito com as multinacionais”,
esclarece Cheila Gonçalves que defende também a
implantação de políticas públicas de tratamento
de hipertensão a base de alimentos funcionais, para
amenizar o sofrimento das pessoas humildes que ainda
não tem acesso a nenhum outro tipo de tratamento
para a doença.
“Já apresentei este trabalho na Europa e Estados
Unidos e eles ficaram impressionados como o Brasil não
dá o menor apoio para transformar as pesquisas em
uma realidade para a sociedade brasileira”,
comenta a professora Mothé que fala que o objetivo
do projeto agora é sensibilizar o governo do
Estado. “Poderíamos montar uma indústria em Magé,
o prefeito de lá já demonstrou interesse e o
cultivar o exsudato no norte fluminense”, sugere a
pesquisadora que recentemente preparou uma apresentação
em Power Point
do trabalho para mostrar aos órgãos
governamentais.
“A grande perspectiva é industrializar este
fitoterápico, é uma forma da universidade dar uma
resposta à sociedade. Só estamos esperando agora
um órgão do governo ou uma empresa privada
nacional viabilizar este processo. Tenho compromisso
com o país, com a universidade, com a sociedade
brasileira, não possa dar esta pesquisa nas mãos
das multinacionais”, desabafa a professora Cheila
Gonçalves Mothé, que há 20 anos realiza pesquisas
com o cajueiro e que defende, com patriotismo, que
os fitoterápicos brasileiros falem a língua
portuguesa.
Saiba mais:
MOTHÉ, C.G.; CORREIA, D.Z. & CARESTIAO, T.
Potencialidades do Cajueiro: caracterização
tecnológica e aplicação. Publit Soluções
Editoriais Ltda, Rio de Janeiro, 2006. 194p.