IVFRJ On Line - 46ª Edição
Ano III - 30 de maio de 2007
Exsudato de cajueiro
Escola de Química da UFRJ desenvolve fitoterápico contra a hipertensão  

Por Lucia Beatriz  

Um fitoterápico, que reduz a pressão arterial, sem provocar efeitos colaterais e de baixo custo. O que parece sonho para muitos hipertensos está prestes a se tornar realidade. Uma pesquisa realizada com o exsudato de cajueiro desenvolvida pelo Laboratório de Processos Orgânicos, da Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), revelou que o derivado natural extraído da casca do cajueiro, depois de processado, pode ajudar a combater a pressão alta.

“O Brasil é o terceiro maior produtor de caju do mundo, a tecnologia para produzir o fitoterápico é nacional, temos tudo favorável. A agroindústria do caju só se interessa pelo pseudofruto e pela castanha, não utiliza o exsudato para nada, fica jogado no chão das fazendas. Conseguimos resultados positivos como fitoterápico com algo que é normalmente rejeitado pela indústria”, ressalta a professora Cheila Gonçalves Mothé, engenheira química responsável pela pesquisa da goma terapêutica contra hipertensão.

O número de hipertensos no Brasil é bastante significativo, são 12 milhões de pessoas, e apenas 15% delas estão em tratamento, ou seja, 8 milhões de pessoas sofrem com a doença, não dispondo de recursos para a compra de medicamentos. “A goma do cajueiro seria uma alternativa de custo barato, a ser distribuído pelo SUS”, explica Mothé que acrescenta ainda que a descoberta pode ser benéfica também para ampliar a geração de trabalho e renda: “além do emprego na indústria do fitoterápico, surgiriam os catadores do exsudato e também as plantações voltadas pra extração desta substância”.


Exsudato de Cajueiro

O exsudato é uma substância liberada no caule do cajueiro quando este sofre agressão do meio externo. É uma resina, inodora, de coloração amarelo- âmbar, que passa por processo de purificação até dar origem a um pó branco rico em polissacarídeos. A goma é triturada, solubilizada, centrifugada, filtrada, precipitada em etanol e finalmente atravessa uma fase de secagem em estufa.  Ao todo são seis etapas de purificação que foram desenvolvidas e patenteadas pelo laboratório de Processos Orgânicos da UFRJ, onde nenhum processo é agressivo quimicamente. O rendimento da substância é de 70%, o que resulta em um produto 100% natural.

“O pó do exsudato pode ser ingerido junto aos alimentos e também preparado em forma de cápsulas ou comprimidos”, explica a professora Cheila Gonçalves que fala que para a sociedade poder usufruir desta nova descoberta  “falta apenas a vontade política ou da iniciativa privada”. Mothé revela que já recebeu assédio de multinacionais para o desenvolvimento do produto, mas que se recusou a vender a patente pois acredita que este fitoterápico deve ser destinado aos brasileiros de baixa renda. “Acho que é o Brasil que deve comercializar esta descoberta, penso isto como uma questão social’’.


Funcionamento no organismo

O efeito produzido pelos polissacarídeos e proteínas presentes na goma, aumenta o número de macrófagos (células de defesa do sistema imunológico), tornando o organismo mais saudável, estimulando o corpo a eliminar gorduras ou outras substâncias nocivas do mesmo modo que o exercício físico. Os resultados com as cobaias foram muito promissores. No grupo de ratos hipertensos que ingeriu a goma, as células do coração ficaram homogêneas e já no outro grupo, que não recebeu medicação, as células apresentaram hipertrofia. A partir de julho a goma será testada em voluntários com pressão alta.

Fotomicrografias à Cortes longitudinais do miocárdio do VE de SHR. 
Coloração: Masson

“Nós adicionamos esta goma em sucos tropicais, derivados de carne (salsicha) e emulsão para salada (maionese), testamos em humanos e verificamos que não há efeitos colaterais. Esta é uma grande vantagem desta goma, visto que os fármacos sintéticos podem ocasionar diversas reações adversas aos pacientes”, lembra a pesquisadora da UFRJ.

Pressão arterial sistólica, em mmHg., dos ratos dos grupos Controle e dos grupos Goma durante as semanas de experimento.


Alimento funcional

A goma pode se tornar alimento funcional com características terapêuticas para evitar doenças cardiovasculares. “Para evitar o boicote da indústria farmacêutica de sintéticos, desenvolvemos um produto natural, queremos que ele entre no mercado como alimento funcional para não entrar em conflito com as multinacionais”, esclarece Cheila Gonçalves que defende também a implantação de políticas públicas de tratamento de hipertensão a base de alimentos funcionais, para amenizar o sofrimento das pessoas humildes que ainda não tem acesso a nenhum outro tipo de tratamento para a doença.

“Já apresentei este trabalho na Europa e Estados Unidos e eles ficaram impressionados como o Brasil não dá o menor apoio para transformar as pesquisas em uma realidade para a sociedade brasileira”, comenta a professora Mothé que fala que o objetivo do projeto agora é sensibilizar o governo do Estado. “Poderíamos montar uma indústria em Magé, o prefeito de lá já demonstrou interesse e o cultivar o exsudato no norte fluminense”, sugere a pesquisadora que recentemente preparou uma apresentação em Power Point do trabalho para mostrar aos órgãos governamentais.

“A grande perspectiva é industrializar este fitoterápico, é uma forma da universidade dar uma resposta à sociedade. Só estamos esperando agora um órgão do governo ou uma empresa privada nacional viabilizar este processo. Tenho compromisso com o país, com a universidade, com a sociedade brasileira, não possa dar esta pesquisa nas mãos das multinacionais”, desabafa a professora Cheila Gonçalves Mothé, que há 20 anos realiza pesquisas com o cajueiro e que defende, com patriotismo, que os fitoterápicos brasileiros falem a língua portuguesa.


Saiba mais:
MOTHÉ, C.G.; CORREIA, D.Z. & CARESTIAO, T. Potencialidades do Cajueiro: caracterização tecnológica e aplicação. Publit Soluções Editoriais Ltda, Rio de Janeiro, 2006. 194p.


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