Seminário Internacional discute a lei das
patentes à luz do desenvolvimento e inovação |
A cidade do Rio de Janeiro, nos dias 5 de 6 de
julho, foi palco do II Seminário Internacional Patentes,
Inovação e Desenvolvimento (II SIPID), organizado
pela Associação Brasileira das Indústrias de Química
Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (Abifina).
O evento reuniu, na Federação das Indústrias do
Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN), especialistas
de diversas nacionalidades para discutir o futuro
do sistema de patentes à luz da inovação no âmbito
dos países em desenvolvimento.
O II SIPID teve início de forma descontraída, com
uma gafe do apresentador - o INPI virou o Instituto
Nacional da Prosperidade Industrial e a troca de
palavras foi muito bem-vinda pelos participantes
da mesa da abertura. "Prosperidade industrial, muito
bem colocado, espero que este seminário seja um
divisor de águas e traga exatamente isto", exclamou
Fernando Sandroni, presidente do Conselho Empresarial
de Tecnologia da FIRJAN.
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Foto: Divulgação II SIPID |
Palestrantes da Índia, China, Austrália, Reino
Unido, Argentina, EUA, além do Brasil, é claro,
apresentaram seus respectivos pontos de vista em
relação ao Acordo Sobre Aspectos dos Direitos de
Propriedade Intelectual Relacionado ao Comércio
(Acordo Adipc ou TRIPS, seu acrônimo em inglês),
assinado no âmbito da Organização Mundial do Comércio
(OMC). O público presente foi convidado a refletir
sobre os efeitos que estas leis podem produzir nos
países desenvolvidos, principalmente no que tange
ao acesso aos medicamentos essenciais.
Refletir sobre os erros do passado para acertar
o futuro
Representantes da indústria farmacêutica nacional,
técnicos do INPI, ANVISA e FIOCRUZ, Procuradores
da República, advogados, economistas, entre outros
segmentos da sociedade participaram do evento que
se propôs a debater um relevante tema para agenda
de um país, como o Brasil, que pretende se desenvolver
dentro de um conceito auto-sustentável. "Se tivéssemos
este interesse há 10 anos certamente nós teríamos
uma legislação patentária muito mais favorável ao
nosso desenvolvimento", refletiu Carlos Alexandre
Geyer, presidente da Associação dos Laboratórios
Farmacêuticos Nacionais (ALANAC).
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Foto: Divulgação II SIPID |
Em 1996, o Brasil introduziu, precocemente, a
lei de proteção a patentes e agora precisa reverter
os prejuízos desta decisão. "Nós, ao contrário da
Índia e Argentina, não aproveitamos absolutamente
em nada as prerrogativas que a legislação internacional
permitia. Além de não nos beneficiarmos do prazo
de 10 anos para adequação e implantação do TRIPS,
o Brasil ainda antecipou o TRIPS PLUS, ao aceitar
as patentes pipelaine", chamou a atenção
Dr. Geyer.
Com a assinatura do acordo, o Brasil prejudicou
a sua indústria farmoquímica e perdeu a oportunidade
de fabricar inúmeros genéricos. "A comparação entre
o setor farmacêutico brasileiro e o indiano deveria
ser um belo exemplo de como o monopólio das patentes
impacta negativamente nas empresas nacionais e nos
consumidores", apontou o professor Cícero Gontijo,
advogado e Procurador da República do Distrito Federal.
O exemplo que vem do Oriente
Atualmente, a Índia possui uma indústria farmacêutica
extremamente forte da qual o Brasil é um grande
cliente. "No período de ação de graça (transição
do TRIPS) a Índia sofreu uma transformação agressiva
em sua indústria farmacêutica, fusões, aquisições,
tornando-se mais forte, ágil, desenvolvendo intensamente
o seu parque de genéricos", comentou Dilip G. Shah,
secretário geral da Indian Pharmaceutical Alliance
(IPA), uma associação que reúne 14 companhias farmacêuticas
indianas baseadas em pesquisa.
Segundo Shah, o sucesso inovativo da indústria farmacêutica
indiana dependeu de uma atitude agressiva em relação
ao mercado externo. "É ele quem de fato financia
a pesquisa na Índia, 90% do que é gasto em pesquisa
e desenvolvimento pela indústria farmacêutica vem
das exportações", revelou o secretário geral da
IPA, que faz ainda previsões positivas para o futuro
da indústria farmacêutica do país: "calcula-se que
em 2010 a Índia será responsável por 28% da produção
de medicamentos genéricos do mundo".
Em 2005, quando o prazo de transição expirou, a
Índia teve que assinar o TRIPS e, através de uma
legislação inteligente, proibiu a entrada de patentes
estrangeiras para os produtos que o país produzia,
protegendo assim a sua indústria de genéricos. "Uma
outra característica da lei de patentes indiana
é não aceitar mudanças triviais nos produtos, para
uma nova patente só com a real eficácia comprovada",
explicou Dilip Shah.
Abusos nas patentes dos medicamentos
Cada vez mais estão se estreitando as áreas para
quais as patentes se especificam. "Para um mesmo
medicamento pode se ter mais de 50 patentes, em
relação à dosagem, população de pacientes, novas
formas farmacêuticas, entre outras patentes múltiplas",
ressaltou Frederick Abbott, especialista em Direito
Internacional da Florida State University.
Quando está para terminar o prazo de uma patente,
geralmente a indústria farmacêutica entra com um
pedido de patenteamento de um segundo uso médico
ou uma nova forma do medicamento. Com isso, a patente
de 20 anos, se estende por mais 40, 60, 80 anos,
sem que ninguém possa produzir o medicamento. "Isso
é uma forma de restrição do direito público, pois
o medicamento fica no domínio único de uma empresa,
que pode cobrar o preço que quiser", chama a atenção
a advogada Maristela Basso, coordenadora de Propriedade
Intelectual do Instituto de Direito do Comércio
Internacional e Desenvolvimento (IDCID).
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Foto: Divulgação II SIPID |
"Uma nova forma física, como um gel, uma pomada
não deveria implicar em mais 20 anos, talvez em
1, 2 anos. É necessário uma moderação, pois a sociedade
fica refém da empresa que detém a patente do medicamento",
reflete Dr. Maristela que faz elogios à ANVISA,
por esta estar trabalhando atualmente com uma perspectiva
mais de saúde pública, não autorizando o segundo
uso, nem novas formulações.
Mirta Levis, diretora executiva da Asociación
Latinoamericana de Industrias Farmacêuticas
(ALIFAR) acredita que as patentes de baixa qualidade
produzem um impacto negativo na sociedade, pois
comprovam o monopólio sob os produtos. "É urgente
melhorar o sistema de patentes concedendo licença
apenas às inovações genuínas", revindica Levis.
Um comitê, com a participação de cientistas, para
fazer auditoria externa nas patentes e a obrigação
de relatórios específicos que possam trazer ao conhecimento
público os riscos de cada patenteamento para a sociedade,
foi o que sugeriu Peter Drahos, professor da Australian
National University, que defende ainda que seja
criado um "google de patentes" com os textos na
íntegra a fim de promover uma maior transparência
nos registros.
Interesse Público X Privado
Como fomentar a inovação em países em desenvolvimento
e preservar as flexibilidades previstas no acordo
TRIPS? Qual é a equação econômico-financeira que
poderia deixar no limite do razoável um empreendimento
privado na área da produção tecnológica voltada
para saúde pública? Em um mundo regido por patentes,
o que pode fazer os países em desenvolvimento enquanto
tentam alcançar as outras nações?
É difícil o equilíbrio da garantia do acesso a medicamentos
com a preservação da capacidade de investimento
da indústria farmacêutica. "De um lado temos o direito
subjetivo público coletivo e de outro o direito
de propriedade. É de fato um confronto clássico
entre o interesse social e o privado", definiu Marlon
Weichert, Procurador Federal Regional no Estado
de São Paulo, especialista em Direto Sanitário.
A tendência mundial hoje é a harmonização, ou seja,
a padronização das leis patentárias a fim de que
o sistema de patentes seja parecido em todo o mundo,
evitando que uma empresa consiga uma patente em
um pais e outro não. A harmonização, ao gerar um
elevado nível de proteção patentária, é de grande
interesse para os países desenvolvidos e extremamente
perigosa para os países em desenvolvimento.
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Foto: Divulgação II SIPID |
Com a harmonização, por exemplo, a ANVISA não
poderia mais fazer restrições quanto ao registro
de produtos de segundo uso ou de novas formas farmacêuticas.
"É necessário reconhecer os diferentes níveis de
desenvolvimento dos países e fugir das negociações
"one size fits all", é o que recomenda Ana
Paula Jucá, advogada da União em exercício na ANVISA.
"É importante que os países mantenham suas liberdades
internas para que possam organizar o seu sistema
de patentes para atender da melhor forma o desenvolvimento
nacional", completa Juliana Vallini, consultora
da Programa DST/AIDS, do Ministério da Saúde.
Saiba Mais:
Guidelines
for the examination of pharmaceutical patents: developing
a public health perspective
FIRJAN: http://www.firjan.org.br
ABIFINA: http://www.abifina.org.br
ANVISA: http://www.anvisa.gov.br
ALIFAR: http://www.alifar.com.ar
MediSourceAsia: http://www.medisourceasia.com/weblinks/indian_asso.htm
IDCID: http://www.idcid.org.br
Ministério do Desenvolvimento, Indústria
e Comércio Exterior:
http://www.desenvolvimento.gov.br
ALANAC: http://www.alanac.org.br