Medicamentos: fracionar ou não fracionar?
Eis a questão. |
A obrigatoriedade do fracionamento de medicamentos
está em debate no Congresso. O Projeto de Lei 7029/06,
que torna o fracionamento de medicamentos compulsório,
está em trâmite na Câmara, desde maio de 2006, e já
sofre pressão da indústria farmacêutica e do setor
de farmácias, que se opõe à obrigatoriedade. Mas quais
são os reais benefícios do fracionamento para a população?
E quais são as principais dificuldades apresentadas
pelos laboratórios nacionais e pelas farmácias para
a recusa da nova proposta? Conheça agora os dois lados
da questão.
Medicamentos na dose necessária para concluir um tratamento.
Apesar da política do fracionamento ter sido lançada
em janeiro de 2005, o consumidor ainda encontra dificuldade
para adquirir os medicamentos fracionados. Como a
lei ainda não foi aprovada, não pode haver um órgão
fiscalizador obrigando as farmácias e drogarias a
aderirem ao fracionamento.
Na avaliação do diretor de Assistência Farmacêutica
do Ministério da Saúde, Dirceu Barbano, da forma como
o medicamento é vendido hoje, a compra não-fracionada
acaba sendo compulsória para o usuário - "Às vezes
o comprador precisa só de 15 comprimidos, mas é obrigado
a comprar 30".
O programa ainda não saiu do papel. Enquanto a indústria
farmacêutica e as farmácias reclamam que não há demanda
pelos fracionados, os consumidores relatam que não
encontram o produto à venda. "Hoje já temos um número
razoável de medicamentos em embalagens fracionadas,
disponibilizados por alguns grandes laboratórios nacionais,
mas não há demanda por parte do atacado e varejo,
pelo que sabemos", declarou Dr. Carlos Geyer, presidente
da Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais
(ALANAC) ao
IVFRJ On Line.
Prós e contras do fracionamento
O fracionamento, além de representar a esperança da
ampliação do acesso aos medicamentos para a população
de baixa renda, pode funcionar também como um importante
aliado para o uso racional de medicamentos. Segundo
o Ministério da Saúde, quantidades e dosagens corretas
de medicamentos para um tratamento específico, além
de representar economia, evita sobras, o que reduz
os riscos de intoxicação provocada pelo uso inadequado
do medicamento.
Foto Ministério
da Saúde |
O registro de apresentações
fracionadas triplicou em 2007 - saltou de
167 para 500.
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Levantamento realizado pela Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (ANVISA) revela que o registro de apresentações
fracionadas triplicou em 2007 - saltou de 167 para
500. Entretanto, apesar de obter a licença, muitos
laboratórios não os fabricam, visto que ainda não
há uma obrigatoriedade legal que estabeleça um prazo
para o fracionado chegar ao consumidor depois de registrado
e nem que exija das farmácias e drogarias a venda
do produto.
Segundo a ALANAC, a principal dificuldade que o setor
farmacêutico nacional irá enfrentar, caso a obrigatoriedade
passe no Congresso, é a adequação de suas linhas de
produção ao fracionamento. "O custo econômico é proibitivo
se não houver uma escala muito grande de produção
e correspondente demanda do mercado", afirmou Dr.
Geyer, que teme o prejuízo causado às pequenas e médias
indústrias farmacêuticas nacionais.
"Apesar de ter triplicado o número de registro de
apresentações fracionadas, a Anvisa ainda não tem
como saber quantos medicamentos fracionados estão,
de fato, disponíveis ao mercado e quantas farmácias
estão realizando este tipo de serviço", foi o que
revelou Cristina Marinho Ribeiro, assessora técnica
da diretoria da Anvisa.
Fim da obrigatoriedade x garantia de acesso aos
fracionados
"A sugestão da ALANAC é pela não obrigatoriedade do
fracionamento e pelo registro de embalagens com quantidades
próximas das usualmente prescritas, pois a maioria
das patologias têm esquemas posológicos definidos
e de conhecimento da própria Anvisa, que seria responsável
por determinar estas quantidades" - foi o que propôs
Dr. Carlos Geyer, para a solução deste impasse no
Congresso.
Uma outra questão levantada pela Associação dos Laboratórios
Farmacêuticos Nacionais é o aumento do risco sanitário
na operacionalização do sistema de fracionamento,
visto que as Vigilâncias Sanitárias, estaduais e municipais,
têm graves problemas para fiscalizar as mais de 50
mil farmácias existentes no país.
"Enquanto os problemas de fiscalização dos pontos
de venda não forem resolvidos e a venda de medicamentos
sob prescrição não for dispensada mediante apresentação
da receita médica, qualquer prática de fracionamento
pode ser muito arriscada, devido ao risco sanitário
envolvido", chamou a atenção Dr. Geyer, que lembra
ainda ser imprescindível a presença do farmacêutico
para promover a dispensação do medicamento fracionado.
Trâmite no Congresso
Durante o trâmite do Projeto de Lei 7029/06 no Congresso,
na Comissão de Defesa do Consumidor, foi acrescentado
ao projeto um substituitivo que eliminava a obrigatoriedade
de fabricação dos medicamentos fracionados e autorizava
o repasse de preços para o consumidor. Já, ao passar
pela Comissão de Desenvolvimento Econômico Indústria
e Comércio, este substituitivo foi derrubado, o projeto
voltando praticamente ao seu formato original.
Uma tramitação no mínimo curiosa: a Comissão que deveria
defender os direitos do consumidor tentou suprimí-los
e a que deveria zelar pelos interesses da indústria
e comércio, não conseguiu aprovar um parecer totalmente
favorável às suas reivindicativas. A única flexibilização
da obrigatoriedade do fracionamento, aprovada na última
Comissão, diz respeito aos laboratórios farmacêuticos
que já oferecem medicamentos em embalagem com quantidade
compatível ao tratamento. Neste caso, a Anvisa poderia,
em caráter excepcional, não exigir o registro do produto
em embalagem fracionável.
Antes de ir para votação no plenário, o Projeto de
Lei ainda precisa passar por mais duas Comissões:
Seguridade Social, Família e Constituição e na de
Justiça e Cidadania. Quem tiver interesse em acompanhar
o trâmite do projeto de Lei 7029/06, basta se cadastrar
no site da Câmara dos Deputados. O futuro da política
do fracionamento está nas mãos dos nossos parlamentares
e a pressão popular, neste caso, pode fazer a diferença.
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