Um
pouco de Terminologia - Parte II
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O Professor François Noël, Chefe do Departamento de
Farmacologia Básica e Clínica da UFRJ, e membro do
conselho consultivo deste instituto, é nosso colaborador
nesta série sobre a terminologia farmacêutica.
Apesar deste conceito ser tão importante no processo
de controle de qualidade de medicamentos, entre outros
para assegurar a bioequivalência entre medicamentos
genéricos e referências, há grande quantidade de definições
errôneas ou pelo menos ambíguas na literatura especializada,
quer seja em livros textos ou em resoluções das agências
regulatórias.
Antes de chamar a atenção sobre alguns erros
conceituais encontrados na literatura, gostaria de
apresentar uma definição que me parece das melhores
por ser simples, objetiva, completa e moderna: "A
biodisponibilidade mede a velocidade e extensão com
as quais um fármaco atinge a circulação sistêmica"
(Canadá - Guidance for industry - Conduct and Analysis
of Bioavailability and Bioequivalence Studies - Part
B: Oral Modified Release Formulations). Nota-se
que definição semelhante é encontrada em vários tratados
especializados (eg: Applied Biopharmaceutics and
Pharmacokinetics, ed. Shargel, L & Yu, A.B.C. Stanford,
Connecticut, 1999; Tratado de Farmacologia Clínica
e Farmacoterapia , ed. Grahame-Smith, D.G. & Aronson,
J.K. - 3a edição, Guanabara Koogan).
Erros conceituais mais comuns:
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1. |
As
definições apresentadas pelas agências regulatórias
americana (FDA) e européia (EMEA) falam em disponibilidade
do fármaco no sítio de ação, o que é impossível
de se medir na prática e, portanto torna a definição
estéril e incoerente em relação aos parâmetros
avaliados para se quantificar a biodisponibilidade
de um fármaco, na prática (para comentários
sobre estes parâmetros, vide: Informativo profissional
do Conselho Federal de Farmácia - Infarma -
15 (n.1-3): 48-50, 2003). Devido à força do
FDA e a aspectos históricos, esta definição
sabidamente confusa é repetida em vários livros
textos. |
2. |
Apesar
de não ser tão comum, devemos ressaltar outro
erro conceitual, desta vez encontrado na legislação
brasileira que usa o termo "absorção" (vide
definição abaixo) em vez de "(absorção e) disponibilidade
sistêmica". De fato, a RDC nº10 da ANVISA diz
que a biodisponibilidade "indica a velocidade
e a extensão de absorção de um princípio ativo
em uma forma de dosagem, a partir de sua curva
concentração/tempo na circulação sistêmica ou
sua excreção na urina". Este erro de terminologia
pode gerar grande confusão, já que um fármaco
que sofrer importante efeito de primeira passagem
hepática (como o propranolol, por exemplo) possui
um baixo fator de biodisponibilidade (parâmetro
que mede a extensão da biodisponibilidade, vide
abaixo) apesar de ser bem absorvido: de fato,
o propranolol consegue atravessar a barreira
da mucosa intestinal e chegar na circulação
sanguínea local, mas é intensamente metabolizado
no fígado, ou seja, antes de chegar na circulação
sistêmica, havendo assim baixa disponibilidade
sistêmica do fármaco inalterado (não metabolizado). |
3. |
Um
terceiro erro conceitual grave, e infelizmente
muito comum, é de confundir biodisponibilidade
e fator de biodisponibilidade, um parâmetro
que mede, somente, a extensão da biodisponibilidade
(e não a sua velocidade). Infelizmente este
erro encontra-se em três livros de Farmacologia
muito usados por nossos alunos de graduação,
a começar pela "bíblia" do Farmacologista (Goodman
Gilman`s The pharmacological basis of therapeutics
- ed. Hardman, J.G., Limbird, L.E. & Gilman,
A.G., 10º edição internacional, Mc-Graw-Hill
Co; Farmacologia Básica e Clínica - ed. Katzung,
B.G., 8º edição, Guanabara Koogan; Farmacologia
- ed. Rang, H.P., Dale, M.M., Ritter, J.M. &
Moore, P.K., 5º edição, Elsevier Editora Ltda.). |
Apesar de ser um termo muito usado e aparentemente
sem ambigüidade, há risco de mal-entendido, sobretudo
pela falta de definição pelos órgãos regulatórios
do país (ANVISA) e de fora (FDA/USA; CEE; Canadá),
mesmo quando eles utilizam este termo em resoluções
abordando os ensaios de biodisponibilidade (vide acima).
De forma estranha, a maioria dos livros textos de
Farmacologia pecam também em não definir o processo
de absorção. Assim sendo, nós parece útil apresentar
aqui uma definição quase que de consenso entre as
fontes consultadas (eg, Principles of Pharmacology:
Basic concepts clinical applications - ed. Munson,
P.L., Mueller, R.A. & Breese, G.R., 1º edição, Chapman
Hall): "a absorção envolve a passagem das moléculas
do fármaco através de barreira(s) existente(s) entre
o sítio de administração e o compartimento vascular".
É fundamental ressaltar aqui que o compartimento vascular
a ser considerado (e isso nem sempre esta claro) é
o da circulação local (por exemplo, as veias mesentéricas,
para a absorção intestinal) e não da circulação sistêmica.
Esta precisão é muito importante para não confundir
os conceitos de absorção e biodisponibilidade (vide
acima o exemplo do propranolol).
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