Nova política leva plantas medicinais e fitoterápicos
ao SUS |
Atendendo a uma demanda da sociedade brasileira, em
2006, o Ministério da Saúde criou duas políticas públicas
para normatizar o uso de plantas medicinais e fitoterápicos,
no Sistema Único de Saúde (SUS). Desde o final de
setembro do ano passado, um Grupo de Trabalho composto
por representantes de diversos Ministérios, Casa Civil,
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)
e Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), se reúne para elaborar
o Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.
Após cinco anos de discussão entre o governo, comunidade
científica e a Casa Civil, em 22 de junho de 2006,
foi assinado o
decreto
n° 5813 que deliberou sobre a
Política
Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.
Este decreto estabeleceu as linhas de ações prioritárias
paro o uso racional desses medicamentos e as diretrizes
para melhoria da qualidade de vida da população e
do complexo produtivo na área da saúde. A expectativa
é que a política resulte na minimização da dependência
tecnológica no Brasil, estabelecendo uma posição de
destaque no cenário internacional.
A
Política Nacional de Práticas Integrativas e
Complementares no âmbito do SUS, publicada na
forma de Portaria Ministerial n°1600, em 17 de julho
de 2006, passou a ampliar as opções terapêuticas dos
usuários do SUS, que podem agora ser tratados à base
de plantas medicinais, fitoterapia, homeopatia, acupuntura,
crenoterapia, entre outras terapias naturais.
Para o professor Leandro Machado, coordenador do Laboratório
de Tecnologia Farmacêutica em Produtos Naturais, da
Faculdade de Farmácia da Universidade Federal Fluminense
(UFF), o ano de 2006 foi bastante rico em debates
e discussões institucionais em torno da fitoterapia.
"Esses debates culminaram com a elaboração de dois
documentos muito importantes. Esses documentos, além
de propiciarem a utilização da fitoterapia pelos usuários
do SUS, visam a melhoria da atenção à saúde, o uso
sustentável da biodiversidade brasileira, o fortalecimento
da agricultura familiar, a geração de emprego e renda
e o desenvolvimento industrial e tecnológico", explica
Dr. Machado.
"Portanto, se trata de uma política ousada que envolve
desde a Casa Civil até os Ministérios da Agricultura,
Ciência e Tecnologia, Desenvolvimento Agrário, Desenvolvimento,
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Integração
Nacional, Meio Ambiente e Ministério da Saúde", comenta
o professor que também coordena a subcomissão de Marcadores
e Padrões de Referência de Produtos Fitoterápicos.
"Orquestrar todos esses setores, em uma época de mudança
de Ministros, não deve ter sido tarefa fácil. Portanto,
esperamos para muito breve novidades do Grupo de Trabalho
instituído para elaborar o Programa Nacional de Plantas
Medicinais e Fitoterápicos".
Principais entraves da nova política
Na opinião do Dr. Leandro Machado, a falta de validação
do uso das plantas medicinais brasileiras é o maior
entrave da Política Nacional de Plantas Medicinais.
"Iniciar um programa de fitoterápicos utilizando plantas
importadas e validadas seria relativamente fácil.
Bastaria o governo incluir na Rename medicamentos
como o Ginkgo biloba, o Hypericum perforatum, e outros
tantos medicamentos fitoterápicos que o Brasil importa.
No entanto, dessa forma em nada seria atendido os
objetivos sociais propostos nessa política. Continuaríamos
sem utilizar o potencial de nossa flora, a gerar empregos
no exterior, a gastar nossas divisas. Portanto, apesar
de ser um caminho mais demorado, devemos sim priorizar
as plantas nativas brasileiras ou pelo menos as que
possam aqui ser cultivadas", defende Machado.
Apesar do Brasil deter um terço da flora mudial, possuir
uma rica diversidade étnica e cultural, herdada dos
negros, brancos e índios que aqui fundiram suas culturas
formando um importante conhecimento etnofarmacológico,
infelizmente nosso país enfrenta dificuldades para
ampliar a produção de fitoterápicos e ainda não consegui
uma atuação destacada no mercado mundial. O governo
reconhece essa área como de interesse nacional, pretende
realizar o financiamento adequado para gerar novos
produtos e se tornar menos dependente de medicamentos
importados. Até 2008, o Ministério da Saúde promete
investir R$6,9 milhões para financiar projetos em
práticas de saúde alternativas no SUS, através de
parcerias público/ privadas para o desenvolvimento
de bioprodutos.
Com mais de 55 mil espécies catalogadas, o Brasil
possui a maior diversidade genética do planeta. "Aqui,
além da riqueza em biodiversidade, temos uma rica
diversidade étnica e cultural que detém o conhecimento
na utilização das ervas e plantas medicinais", afirma
o Dr. Leandro Machado. "Todo esse caldo de cultura
demonstra que estamos sentados em um pote de ouro,
enquanto gastamos nossas parcas divisas adquirindo
medicamentos importados".
O professor lembra ainda que, recentemente, quando
houve greve por melhores salários na receita federal
e logo em seguida na vigilância sanitária, "vimos
que somos um país completamente refém da importação
de insumos e medicamentos. Em poucos dias de paralização
já começaram a faltar medicamentos e "kits" de diagnóstico",
reclama Leandro Machado. Para ele, "o desenvolvimento
de medicamentos elaborados com a nossa rica fauna,
representa, portanto, uma questão de independência
da nação e de segurança nacional. Uma possibilidade
de diminuirmos nossa dependência externa e também
de alavancarmos nossa economia exportando os excedentes
dessa produção e gerando divisas para nosso país.
É imprescindível que haja investimento maciço do governo
em pesquisas básicas e tecnológicas", revindica.
Opção pelos fitoterápicos
Fitoterápicos são medicamentos produzidos a partir
de derivados vegetais como extrato, tintura, óleo,
cera e suco. A industrialização da planta medicinal,
com a obtenção dos seus derivados, é a transformação
desse em medicamento fitoterápico. Esse processo de
industrialização permite o desenvolvimento de um produto
com segurança, eficácia e qualidade garantidas, além
de produzir a quantidade e o modo de uso pela população.
"Temos assistido, nos últimos anos, o retorno crescente
da fitoterapia, terapêutica, que até bem pouco tempo,
era a base dos tratamentos, ainda presente na memória
coletiva das populações. Atualmente, países como França,
Alemanha, Suíça e Itália têm utilizado a fitoterapia
de forma crescente, em perfeita harmonia com os medicamentos
de síntese", relata o professor Leandro Machado. Alguns
países classificam os fitoterápicos como suplementos
nutricionais. O Brasil apresenta uma legislação moderna,
que considera os fitoterápicos como medicamentos e
requer o registro na Anvisa antes de sua comercialização.
"A utilização de um fitoterápico como medicamento
se inicia com a padronização na sua produção. Deve
ser desenvolvida uma fórmula mestra, que possa garantir
que todos os lotes da produção irão gerar um produto
com a mesma composição química, garantido assim a
sua eficácia terapêutica e segurança no uso. Portanto,
o profissional farmacêutico é parte essencial no crescimento
da fitoterapia", alerta Leandro Machado, que acredita
que preparar um medicamento fitoterápico de qualidade
é mais difícil que produzir um medicamento de síntese,
visto que o fitoterápico é um ser vivo, sujeito a
mudanças climáticas e de solo, ataques de predadores,
entre outras variações.
A principal medida da nova política foi a catalogação
das plantas medicinais com potencial curativo. "Já
existe uma lista com 14 espécies que irão ser utilizadas
inicialmente. Para se chegar nessa lista, foi realizado
um levantamento das espécies utilizadas nos programas
estaduais e municipais já existentes no Brasil. Se
cruzou essa lista com um levantamento das doenças
mais prevalentes na população brasileira", revela
o professor. Atualmente está em desenvolvimento a
criação da base de dados sobre o conhecimento tradicional
de plantas medicinais, contendo informações que irá
orientar projetos de pesquisa para o desenvolvimento
de produtos e organizará o seu registro, protegendo
assim os detentores desse conhecimento.
"Estão sendo elaboradas monografias para garantir
o uso seguro e eficaz desses produtos pela população.
Os Laboratórios Oficiais já estão se mobilizando para
garantir o fornecimento desses fitoterápicos. Portanto,
está sendo rompida a inércia que nos encontrávamos
e esperamos ter novidades para breve. Lógico que a
cobrança da sociedade organizada em muito pode acelerar
todo esse processo. Por isso, parabenizo esse órgão
de divulgação pelo interesse no tema", elogia Dr.
Leandro Machado.