Burocracia atrapalha a ciência |
Dificuldades
de importação atravancam a pesquisa brasileira
O Brasil tem o nono maior PIB (Produto Interno
Bruto) do mundo, está entre o terço de maior renda
per capita do planeta e é o 17° país em produção
científica. O número de pedidos de patentes, anualmente,
supera 24 mil e só tende a crescer de acordo com
especialistas. Apesar disso, a burocracia das entidades
públicas atua como um peso, dificultando o processo
de pesquisa e desenvolvimento científico, com lentidão
no processo de importação e altas taxas alfandegárias.
Um levantamento do Banco Mundial divulgado este
ano mostra que o Brasil é um dos países mais burocráticos
do mundo. Na lista de 144 países analisados, pior
do que o Brasil só Laos, Congo, Moçambique e Haiti.
Quando se importa algo para o país, são cobrados
do cientista pelo menos três encargos tributários.
Como o país não é auto-suficiente para a pesquisa,
muitos dos materiais utilizados têm de vir de outros
países, sujeitando o pesquisador às dificuldades
e cobranças. "Parece que é tão difícil, ou mais,
importar uma medicação ou um material de laboratório,
do que um carro. O que é um absurdo", reclama Mayana
Zatz, geneticista da USP - em entrevista ao Fantástico.
Existem dois meios de se importar algo para o Brasil.
O primeiro é fazer a importação direta, contatando
o fornecedor diretamente e fazendo o pedido. O outro
meio é por meio da contratação de intermediários,
como fundações ou firmas de importação. Existe ainda
um outro método: as doações enviadas pelos correios,
ou vindas dentro da mala dos pesquisadores que voltam
ao Brasil. No entanto, essa forma de importação
é ilegal e limitada a pequenos itens.
Para que o pesquisador faça a importação direta,
é necessário que a instituição de pesquisa que representa
o cientista seja cadastrada com a fornecedora do
material, uma vez que o pedido não pode ser feito
por pessoas físicas. Uma vez passada essa barreira
ainda existem outras, ainda mais complicadas. Um
exemplo do que passam os cientistas: importar animais
geneticamente modificados é um problema. Primeiro,
é preciso uma autorização e um certificado da Comissão
Nacional de Biossegurança. Depois, é necessário
um documento atestando a saúde dos animais. E ainda
outro certificado, agora do Ministério da Agricultura.
O Banco Central também tem de aprovar e a Receita
Federal deve emitir uma licença de importação.
E mesmo que todas essas etapas sejam vencidas, não
adianta nada se o projeto não tiver o aval de alguma
agência de incentivo à pesquisa, como o CNPq - o
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
e Tecnológico. "Se alguma dessas instâncias atrapalha,
aí, às vezes, você tem que voltar tudo para trás,
porque esses papéis têm um prazo de validade", diz
Luiz Eugênio de Mello doutor da Universidade Federal
de São Paulo. O pesquisador ainda corre o risco
de ter seu produto barrado pela alfândega, por causa
de greves e outros problemas.
Para fugir dessas preocupações, muitas vezes o que
se faz é contratar um intermediário para cuidar
do processo de importação. O intermediário chega
a cobrar até cinco vezes o preço original do material
e a entrega demora em torno de 30 a 45 dias. As
fundações e as empresas de importação se ocupam
dos problemas, no caso de greves, como a da vigilância
sanitária e da receita federal que houve recentemente,
os produtos ficam retidos e neste caso, são eles
que se responsabilizam pelo correto armazenamento
em condições ideais e pelo pagamento de taxas extras.
O governo brasileiro chegou a criar um programa
de importações científicas chamado "Importa Fácil".
Mas, segundo os pesquisadores, não tem dado certo.
"Acho que deveríamos ter leis específicas, facilitando
as compras no caso de pesquisa comprovada. Já é
extremamente difícil conseguir financiamento e gastar
muito mais com os produtos por conta de cambio,
taxas e burocracia é um absurdo." disse Iolanda
Fierro, pesquisadora da Universidade Estadual do
Rio de Janeiro (UERJ).